Mulheres na Justiça: último dia de evento aborda uso de IA e seu impacto sobre as mulheres
O uso de inteligência artificial no Judiciário – sobretudo em julgamentos com perspectiva de gênero e voltados a grupos minorizados – foi um dos temas que guiou os debates realizados na manhã desta sexta-feira (13/9), durante a 3.ª edição do evento Mulheres na Justiça: novos rumos da Resolução n. CNJ n. 255.
A programação do evento, que teve início nesta quinta-feira (12/9), segue até o fim do dia com painéis e oficinas voltados à discussão de medidas para assegurar a igualdade de gênero nos órgãos do Judiciário. O evento pode ser assistido na íntegra pelo canal do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) no YouTube.
Ministra do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Edilene Lôbo suscitou importantes reflexões sobre como as mulheres estão inseridas no ambiente digital. A painelista defendeu que as integrantes do sistema de Justiça precisam compreender a aplicação da inteligência artificial, já que a tecnologia é, por vezes, coadjuvante em vários processos.
Ministra do TSE, Edilene Lôbo, fala sobre a inserção das mulheres no ambiente digital. FOTO: G. Dettmar/Ag. CNJ
“Nós precisamos falar sobre a inteligência artificial aplicada ao Judiciário nas suas várias facetas, principalmente para que as magistradas possam, com o uso das tecnologias, aplicá-la a tarefas repetitivas gerenciais que podem lançar mão da linguagem algorítmica, e para que a missão de julgar como pacto de salvar a humanidade seja primordial”, defendeu a ministra.
Também foi apontado pelas palestrantes a preocupação com a automação de decisões que podem deflagrar resultados danosos à sociedade, principalmente às minorias. Juíza do Tribunal Regional Federal da 1.ª Região (TRF 1), Raffaela Cássia de Sousa defendeu que é preciso trabalhar para que comandos de programação possam afastar qualquer tipo de preconceito nesse contexto. “A inteligência artificial é neutra? Se sim, é discriminatória. Então a gente precisa trazer o direito à diferença para dentro da inteligência artificial”, argumentou.
A possibilidade de discriminação algorítmica também foi um desafio apontado pela juíza Eunice Prado, do Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco (TJPE). Na ocasião, a magistrada apresentou práticas que podem ser implementadas pelo Judiciário para dar mais espaço às mulheres nesse campo, entre as quais, aumentar a participação de magistradas nas áreas dos tribunais voltadas à tecnologia da informação (TI); elaborar planos para aumentar a persidade na força de trabalho relacionada à tecnologia; amplificar as oportunidades de capacitação para mulheres e de participação em eventos no campo de TI.
Procuradora de Justiça do Ministério Público do Estado de Goiás (MPGO), Ivana Farina pontuou normas e iniciativas que precedem o contexto tecnológico e digital, destacando aquelas voltadas à garantia dos direitos da mulher. Ivana enfatizou ainda a questão da interseccionalidade de gênero e raça, e salientou que a inteligência artificial precisa ser programada para considerar persas singularidades e particularidades existentes dentro da sociedade.
Mudanças climáticas e grupos minorizados
As atividades da manhã também incluíram discussões sobre os novos rumos do Poder Judiciário, especialmente diante do cenário de mudanças climáticas e o impacto sobre grupos sociais historicamente excluídos.
Subprocuradora-geral da República, Rachel Dodge, participou do painel sobre crise climática. FOTO: G. Dettmar/Ag. CNJ
A partir de um caso real ocorrido na Enseada da Baleia – comunidade caiçara localizada no extremo sul de São Paulo –, a juíza Hallana Miranda, do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), exemplificou como mulheres e comunidades tradicionais podem ser negligenciadas por instituições em situações de crise climática. Na ocasião, a magistrada evidenciou o conceito de “justiça climática” e a consciência sobre como essas mudanças do clima global impactam a população de forma desigual, agravando injustiças.
Outro aspecto relevante da questão climática, apontado pela subprocuradora-geral da República, Raquel Dodge, diz respeito à proteção dos vulneráveis e à garantia de que eles tenham acesso à Justiça em situações de emergência. “Essas pessoas, na crise climática, sofrem mais severamente os danos do que todos nós”, reforçou Dodge.
Ao falar sobre grupos minorizados, a desembargadora do Tribunal Regional Federal da 3.ª Região (TRF-3), Cristina Nascimento, levou à mesa as dificuldades na compreensão da persidade e das complexidades das violências sofridas por grupos de mulheres de diferentes etnias.
“Uma mulher indígena que sofre violência doméstica dentro da sua terra e do seu povo, muitas vezes, não tem assistência da polícia e do ministério público. E essa demanda nem mesmo chega ao Poder Judiciário, porque por uma visão discriminatória e totalmente colonizadora, entende-se que [a violência] pode ser um hábito local, da cultura”, relatou Cristina.
Assista aos painéis da manhã de sexta-feira (13/9) no evento Mulheres na Justiça: novos rumos da Resolução n. 255 – 3.ª edição
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Texto: Jéssica Vasconcelos
Edição: Geysa Bigonha
Agência CNJ de Notícias
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